Alpes em África
Dia 4, Ifrane
A noite passou-se bem neste encantador Riad. Mal, estava o tempo. Como já tinha sido habitual nas outras noites, acordava antes da hora. Cerca de uma hora antes da hora combinada, despertava e ficava a rebolar na cama até me levantar. Aqui não foi diferente, e logo quando despertei dei conta da chuva que caía lá fora. Batia certo com a previsão que tinha consultado antes de sair da pátria mãe. Felizmente, e se o tempo não falhar ao previsto, este seria o único dia de chuva da nossa estadia em África. Hoje seria então dia de agasalhos e fatos de chuva. Subimos ao terraço onde se serviam os pequenos-almoços. Local castiço, fechado com vidros coloridos. Lá fora conseguia ver-se as milhares de antenas parabólicas penduradas, por vezes de qualquer jeito, sobre os telhados.
Não estava particularmente quente, pelo que o café veio mesmo a calhar. Pequeno-almoço usual, com as tradicionais panquecas marroquinas (de duas qualidades), o habitual pão saboroso, tudo ornamentado com mel e doce de alperce à descrição.
De seguida havia que pagar a conta, recolher as motas, carregar malas e seguir em direcção ao Atlas. 370 dirhams (11 dirhams = 1 euro) acrescidos de mais 60 para o parque das motas, nada mal como conta para três marmanjos portugueses. Contas rigorosas, calhavam 13€ a cada um. A estes preços, sinceramente, dispensa-se o campismo! Fomos buscar as motos debaixo de uma chuva miúda, já equipados a rigor e capacetes postos. O pessoal na rua ia nos mirando com alguma curiosidade, provavelmente por nos ver assim equipados montados em coisa nenhuma. As máquinas estavam onde as tínhamos deixado e ainda melhor, como as tínhamos deixado.
Pagámos a dívida e levámo-las dali até ao riad onde pernoitámos. Carregou-se a bagagem, pedimos ao tipo simpático e profissionalíssimo do riad para nos tirar um retrato e pisgámo-nos de ali em direcção à montanha.
A saída da Medina aquelas horas foi pacífica, e num instante estávamos na próxima estação de serviço no exterior da cidade a lubrificar as correntes. Estava um frio do “caneco” e uma chuva miudinha chata.
Logo depois de deixar Fés começou a subida em curva. Íamos com cuidado e sem stress. Já há beira de Ifrane, tinha identificado um desvio pelo parque em redor de uns lagos que há por ali.
O primeiro lago fica logo à beira da nacional, e é depois contornando este que se faz o desvio prosseguindo até aos próximos. Fizemos uma paragem junto ao lago. Descemos até lá abaixo. O Benedito queria mesmo tirar uma foto à beira do lago, levou a mota até à beira e depois à artista puxou um pião, cujo o resultado previsível no meio daquela lama só podia ser o arrear da Strom no chão! Nada de grave, apenas um encosto da mala lateral no chão.
Rapidamente se abeiraram dois marroquinos montados em cavalos com decoração típica. Queriam nos levar a dar uma volta ao lago, mas cavalo por cavalo, preferimos ficar com os nossos.
Saímos dali com cautela, para não repetir a manobra do Benedito. Contornámos o lago e prosseguimos por uma pequena localidade. Recordo que tinha uma estrada esquisita. Cerca de metro e meio de alcatrão no meio, o resto tudo rebentado e passeios novos elevados a cerca de meio metro de altura. Continuava a chuva miudinha e o frio. Por esta altura estávamos bem desconfortáveis com as pontas dos dedos a gelar. Seguimos o percurso que se enfiava pelo meio de arbustos rasteiros em curvas e contra-curvas. A estrada continuava manhosa, estreita e suja. Volta não volta, tínhamos de andar pela beira, para evitar os camiões que vinham de frente. Chegámos ao segundo lago e ainda perguntei ao Barradas se lhe apetecia parar à margem do lago. Com o tempo desagradável que estava nem ele, nem eu, fizemos questão de parar por ali, seguimos. Pouco tempo depois estávamos de regresso à nacional a caminho de Ifrane. Curioso local este que nada tem a ver com o resto. Foi fundada pelos franceses como estância de esqui. Está a 1700m de altitude no Médio Atlas, e está edificada e organizada tal qual uma estância alpina. As casas aqui assemelham-se a chalés, os jardins são verdejantes e arrumados ao estilo europeu.
De repente parecia que tínhamos chegado à Suíça! É certo que faltava a neve, que por esta altura já desceu encosta abaixo, mas a decoração e o frio faziam em tudo lembrar os Alpes europeus.
Depois de andar às voltas, encontrámos o centro da cidade e estacionámos as motas. Enquanto tratávamos da coisa, num carro defronte um grupo de duas ou três jovens marroquinas “esgazeadas” faziam-nos olhinhos e sorrisinhos malandros! Estávamos cheios de fome, de modo que despachámo-nos a ir procurar almoço.
Até os restaurantes aqui são diferentes. Menos típicos e mais ao género café e snack-bar. Desencantámos um e mandámos vir umas tagines kefta (aquela espécie de almôndegas na chapa) muito inferiores às do nosso amigo Aziz. Estava quentinho no estabelecimento e isso era bom.
No final do repasto quando espreitámos lá para fora, o Sol parecia brilhar, fantástico!... A chuva parecia ter ido de vez, e a temperatura estava mais amena. Saímos de Ifrane, continuando o caminho pelo Atlas. Numa passagem pelos vários lugarejos apanhei um susto de morte. Seguia atrás do Benedito, e este do Barradas. Logo na minha traseira seguia um carro “colado”, à boa maneira marroquina. Numa travagem repentina do Benedito para não sei o quê, tive de encostar travão para parar a Tiger. Nesse mesmo momento senti a lateral do carro que seguia atrás de mim de raspão na perna esquerda. Fiquei branco que nem cal! Caiu em mim aquela sensação desagradável de quão frágil somos e expostos estamos quando vamos de mota. Foi mesmo uma questão de milímetros para que a viagem não acabasse para mim naquele momento. Para mim, e provavelmente para o Benedito com o qual teria logo chocado se houvesse impacto. O Barradas teria de fazer o regresso a solo. Felizmente estávamos todos bem, mas eu já me estava a marimbar para fotos e só queria sair dali... E assim continuámos em direcção ao Atlas...
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