Primeiro problema
Não foi totalmente inesperado mas ao fim de três anos e meio surge então o primeiro problema com o Coiso...
Mas antes um primeiro enquadramento. O sistema de transmissão final da Spyder é por correia e composto por duas polias. A primeira no eixo do motor (mais pequena) e a segunda (enorme) na roda traseira.
Desde sempre que tem aparecido no fórum americano relatos com problemas na polia dianteira (no eixo do motor). Os primeiros sintomas são de começar a ficar coberta com um pó vermelho (ferrugem) apelidam até o fenómeno de "red dust of death" (pó vermelho da morte). O estado final surge mais tarde (uns bons quilómetros depois) quando a polia cede e o eixo do motor fica a rodar em seco deixando a Spyder totalmente apeada... Não existe propriamente um padrão. Há uns raros casos que falham abaixo dos 10.000km, a maioria em redor dos 25.000km e sei de um caso pelo menos que surgiu aos 85.000km. Há algumas teorias de que o esticador de correia (que não vem de fábrica) poderá mitigar o problema mas sem nenhuma certeza.

E a que se deve o fenómeno?... Tecnicamente chama-se "fretting" e a melhor tradução para português creio que será corrosão por atrito... Ora então, o eixo do motor encaixa na polia com um relevo de roda dentada. O encaixe é bastante justo mas claro sempre sujeito a micro folgas. Com o rodar do eixo a binários consideráveis estas folgas (ainda que muito pequenas) provocam deslocamento e logo fricção... Sendo duas superfícies metálicas esta fricção vai provocar desgaste em particular no interior da polia que no caso parece ser de uma liga metálica mais fraca. Felizmente pois substituir a polia será com certeza significativamente menos trabalhoso e caro do que trocar um eixo de motor. O que aparece então por fora da polia é o óxido ferroso ou as partículas metálicas ferrugentas resultante desse desgaste.
A partir do momento que o processo inicia o encaixe interior da polia vai moendo lentamente até o perfil ficar achatado quase sem dentes. Nessa altura claro o eixo já não agarra e fica a rodar em seco deixando de transmitir rotação à polia e ficamos apeados.
Curiosamente parece que não é um fenómeno raro neste tipo de sistema de transmissão (por exemplo sucede também nas Harleys). O fabricante está totalmente ciente deste problema e estou em querer que até deverá considerar a polia como uma peça de desgaste apesar de assumir a troca se a situação suceder em garantia.
Estava perfeitamente ciente deste problema e tinha até então feito verificações de rotina a cada 5000km. Na última verificação de Abril a polia apresentava-se como mostra a foto.

Com quase três anos e fora do período de garantia restava-me então lançar mãos à obra... Poderia não ter sujado as mãos e ter entregue o problema ao concessionário mas como estava bem informado sobre o assunto resolvi fazer eu a troca.
O Coiso tem data de fabrico 05/2018 e à época não se aplicava qualquer lubrificante no eixo na montagem sendo este o resultado. Segundo parece recentemente a marca começou a utilizar (e recomendar) Kluberpaste 46 MR 401 no encaixe. Trata-se de um lubrificante de alta pressão que segundo os mais entendidos no fórum americano poderá servir mas não cumpre totalmente no sentido de não ser hidro resistente. Isto implicará que tenha de ser reaplicado rotineiramente.
Ora os especialistas (e há uns quantos no fórum, mecânicos e engenheiros com uns anos disto) recomendam antes um lubrificante de base molibdênio... E do que se trata? Trata-se de um mineral com baixa solubilidade em água, é o sexto elemento com maior ponto de fusão (2163ºC), tem uma das menores expansões têrmicas e uma resistência à tracção imensa quando reduzido a partículas muito pequenas.
Ora então, lubrificantes dotados destas minúsculas esferas encontrei basicamente dois - Loctite LB8012 moly paste anti-seize e Honda M-77 assembly paste. O primeiro só se arranja em boiões de quase meio quilo a um preço louco.
O segundo é o utilizado pelos concessionários Honda em tudo o que é transmissões por veio como por exemplo na Pan European e na Goldwing. É vendido em bisnagas de 75g e não sendo nada barato (34,95€) era o mais adequado para o caso.

Liguei para um concessionário Honda da zona mas correu mal. Parecia que estava a querer alguma coisa fruto da minha imaginação. Desisti rapidamente, talvez ali os veios sejam montados com óleo Fula... Ironias à parte quando o cliente tem de esclarecer o vendedor sobre as características dos seus produtos algo vai mal.
Mandei-me ao google e consegui encontrar a tal bisnaga num site holandês especializado em material Honda. Ao fim de uma semana já tinha a sacana da bisnaga em casa.
Mas muito antes disso encomendei as peças que precisava para a substituição, a saber uma polia nova e um parafuso de aperto (referência #250001017) que como recomenda o manual, terá sempre de ser trocado com a polia...
Relativo à polia havia ainda uma novidade. A partir de Setembro de 2020 o fabricante passou a utilizar um novo modelo de polias (referência #705503239), facilmente identificável até pois é pintada a branco (em vez de preto como a que tinha referência #705502134).
Do que pude investigar a peça foi redesenhada. Espantosamente não por causa deste problema mas por outro que surgiu no novo modelo da Spyder RT - um assobiar a determinadas velocidades. Parece que no modelo anterior da polia formavam-se bolsas de ar entre a polia e a correia que depois provocavam um irritante assobiar. Aparentemente isso era muito audível no modelo RT eu devo confessar que nunca me apercebi de nada no modelo F3-S.
Descoberta as referências foi fazer encomenda na Benimoto que prontamente me respondeu que as peças estavam encomendadas mas que a nova polia não existia em stock e teria de vir da fábrica no Canadá - previsão de entrega final de Abril ou cerca de três semanas... Ao cabo de três semanas ainda nenhuma notícia da polia... Não estava muito preocupado por que já tinha verificado que não havia folgas pelo que seria seguro continuar a andar.
Entretanto soube o porquê do atraso. A nova polia estava esgotada na fábrica e apenas com data de disponibilidade para o inicio de Junho... Estávamos em meados de Maio e estava esperançoso que a minha encomendada no inicio de Abril chegasse antes... E chegou! A dia 21 de Maio já a tinha em casa junto com o parafuso... Exactamente 44 dias e 202€ depois (polia, parafuso e massa) tinha todo o material necessário...

Seis semanas e picos é manifestamente muito o que penso estará relaccionado com o facto de estar esgotada pois já mandei vir peças da fábrica que chegaram em pouco mais de duas semanas o que para mim é totalmente razoável... Mesmo assim melhor do que me aconteceu no passado de ter de esperar dois meses por peças encomendadas a fábricas japonesas... Nesse aspecto da minha experiência creio que a Triumph era a melhor no prazo de uma semana era entregue tudo.
A troca foi mais simples do que esperava... Primeiro levantar a roda traseira e rodá-la puxando a correia fora... Depois a polia antiga não deu luta nenhuma para sair e creio que isto será devido ao facto de não ter deixado chegar a situação até à última. Vi vários relatos de polias que tiveram de aquecidas a maçarico, arrancadas com um extractor e algumas mesmo que tiveram de ser partidas. No meu caso foi aplicar um pouco de WD-40, deixar actuar e puxá-la com uma mão. O eixo do motor não tinha danos como parece ser assim na maioria dos casos. É feito de uma liga metálica resistente ao contrário do material da polia e ainda bem que é assim.

Depois foi questão de limpar bem o eixo com líquido próprio e uma uma escova de arame, lubrificar bem os encaixe com a pasta maravilha da Honda, colocar no sítio e apertar o parafuso ao binário recomendado que por acaso foi revisto (provavelmente por este problema) e subiu de 125 para 150Nm. Deixei também uma marca para de futuro ver se o parafuso continua no sítio. Finalmente colocar a correia de novo nas polias pelo menos processo em que foi retirada ou seja empurrando-a na polia traseira à medida que se faz rodar a roda. Não houve necessidade de ajustes de correia uma vez que a roda não mexeu de sítio e a nova polia tem as mesmas dimensões da antiga. Por descargo de consciência verifiquei a tensão da corrente que claro também não tinha mudado.

Tudo foi bastante simples, rápido e feito com o material que pretendia.
Como disse é um problema sobejamente conhecido com as Spyder pelo que não me apanhou desprevenido... Mas convenhamos que 200€ em material não deixa de ser bem desagradável...
Ainda não estou certo se deva ou não colocar um esticador de correia que se supõe deverá reduzir os solavancos da polia e logo reduzir o fenómeno de "fretting"... Para já é continuar a vigiar e esperar que o lubrificante especial de corrida faça o seu efeito e evite a destruição da nova polia
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Posted on 2022-11-25 by ZuluEcho
Posted on 2022-11-25 by Daniel Santos
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